Chuck Palahniuk - Assombro

Literatura norte-americana contemporânea
Chuck Palahniuk - Assombro - 512 Páginas - Editora Leya - Tradução de Érico Assis - Lançamento no Brasil: 4/11/2016 (Lançamento original 2005).

Perturbador, macabro, nauseante e brutal são alguns dos adjetivos normalmente associados a este livro de Chuck Palahniuk, autor de "Clube da Luta", romance de 1996 que se transformou em um filme cult na adaptação de 1999, dirigido por David Fincher e estrelado por Brad Pitt e Edward Norton. O filme já adiantava algumas pistas do estranho processo criativo de Palahniuk, um especialista em desnudar a decadência da raça humana em nosso tempo, mais especificamente na sociedade de consumo norte-americana, com seus personagens desajustados, autênticos perdedores ou "losers" como costumam ser chamados por lá.

De fato, o estilo polêmico do autor alcança mesmo níveis perturbadores, verdadeiramente de repulsa, neste romance que é uma coleção de contos independentes. Nas leituras públicas que Chuck Palahniuk costuma fazer de um dos contos do livro, "Tripas", é comum pessoas da audiência desmaiarem ou abandonarem o evento. Tenho que admitir que fiquei realmente incomodado com certos trechos da narrativa alucinada do polêmico escritor, que absolutamente NÃO recomendo para leitores de muita sensibilidade. Contudo, aqueles que decidirem se aventurar na leitura e conseguirem superar as passagens mais bizarras, encontrarão um texto de extrema criatividade, um escritor que tem uma assinatura e estilo inconfundíveis e que certamente deixará uma marca nas suas vivências de leitores, como poucos autores deixaram. No meu caso particular, lembro de uma experiência de desconforto semelhante com "Os 120 dias de Sodoma" do Marquês de Sade, um paralelo de certa forma similar às situações de violência extrema.

Em "Assombro", um anúncio muito estranho promete fama e sucesso para aqueles que decidirem participar de um retiro de escritores. Dezoito pessoas, que precisam esquecer o seu passado, aceitam o desafio de se isolar de tudo e de todos por três meses. Ao chegarem no local reservado ao evento, uma espécie de teatro abandonado, logo descobrem que ficarão totalmente presos e incomunicáveis com o mundo exterior, sem portas ou janelas, um ambiente claustrofóbico de confinamento forçado que supostamente irá favorecer o processo de criação de suas respectivas obras. O processo se transforma em um louco "reality show" no qual os próprios participantes tentam se superar ao infligir dor e sofrimento a si próprios e uns aos outros, ficando sem energia, aquecimento e comida.


"RETIRO DE ESCRITORES:

ABANDONE SUA VIDA DURANTE TRÊS MESES.

Simplesmente suma. Deixe para trás tudo que impede você de criar sua obra-prima. Seu emprego, sua família e seu lar, todas as obrigações e distrações, deixe tudo em espera por três meses. Viva com gente que pensa como você, num ambiente que dá apoio à imersão total em seu trabalho. Comida e abrigo de graça para aqueles que se qualificarem. Aposte uma fração mínima da sua vida na chance de criar um novo futuro como poeta, romancista ou roteirista profissional. Antes que seja tarde demais, viva a vida com a qual sempre sonhou. Vagas extremamente limitadas. (Pág. 110)"

Os personagens ganham alcunhas de acordo com as características de seus "pecados" anteriores, assim como: "Lady Mendiga", "Agente Fuxico", "Duque dos Vândalos" e assim por diante. Ficamos conhecendo as suas respectivas histórias em cada um dos contos. Milionários que descobrem como pode ser libertadora a vida de um "homeless" ou como a invisibilidade da pobreza pode ser segura e confortadora, repórteres que criam falsas realidades para vender roteiros de sucesso, um casal que decide realizar um filme pornográfico caseiro, ou bonecos "anatomicamente corretos" para reconstituição de casos de assédio sexual e que são efetivamente abusados sexualmente por detetives. Enfim, tudo aquilo que faz com que o ser humano "transforme objetos em pessoas e pessoas em objetos", uma das melhores frases de Palahniuk neste romance.


Talvez já tenha ficado claro a esta altura que o "assombro" de que trata o autor não tem nada em comum com as tradicionais histórias de assombrações e fantasmas. Aqui o terror se revela nas distorções provocadas por uma vida sem esperança, na qual o sarcasmo, a insanidade e a violência são os novos valores ditados pela mídia em nome da sociedade, somos humanos sem dúvida, mas existirá uma saída para preservarmos algum resto de humanidade? É disso que trata o universo de Chuck Palahniuk e, decididamente, não é um universo bonito ou agradável.

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